Por Franklin Douglas
Noberto Bobbio buscou, em seu Dicionário de Política, sintetizar os diversos conceitos que giram em torno da política. Nessa obra, elaborada conjuntamente com Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino, ele trata de vários verbetes, entre os quais se dedicou evidentemente ao da “política”.
Mais do que a mera definição, o pensador italiano também refletiu acerca do conceito: significado clássico e moderno, tipologia, fim da política e a política como relação amigo-inimigo. Especificamente sobre esta última, diz Bobbio: “política seria o antagonismo e sua função consistiria na atividade de associar e defender os amigos e combater os inimigos” (BOBBIO et al, 1995, p. 959).
A política como relação amigo-inimigo tem necessariamente um terceiro ente envolvido: o uso da força. Com o monopólio do uso da força, a resolução dos conflitos entre amigo versus inimigo dar-se-ia à favor daquele com a possibilidade maior de uso da força.
Este preâmbulo todo o faço para um alerta às oposições: a oligarquia de tudo fará para separá-las e garantir a vitória eleitoral neste pleito de 2010, e um desses instrumentos será constituir, pelo uso da força midiática que possuem, amigos em inimigos.
O maior exemplo vem da convenção do PCdoB, PSB e PPS que homologou as candidaturas de Flavio Dino (PCdoB) – governador, Miosótis Lúcio (PPS) – vice, Adonilson Lima (PCdoB) e José Reinaldo Tavares (PSB) – senadores, realizada no último dia 30 de junho, no auditório da Assembléia Legislativa.
Como de esperar, cada um desses candidatos foi chamado a discursar. Especialmente sobre o discurso do ex-governador José Reinaldo Tavares (PSB), a mídia sarneista assim retratou:
“(...) Foi José Reinaldo quem deu o tom das provocações aos jackistas, quando falou sobre a adesão do PPS: ‘O PPS resolveu romper as amarras que o mantinham preso àquele esquema que não leva a nada’. O ‘esquema’ é a coligação do PDT com o PSDB, da qual o PPS sempre foi linha auxiliar”. (O Estado do MA, 01/07/2010, p. 03).
E acrescenta o jornal:
“Em seguida, o presidente da legenda, Paulo Matos, tentou consertar, fazendo referências a Jackson Lago e Roberto Rocha (candidato ao Senado pelo PSDB), mas foi vaiado.” (O Estado do MA, 01/07/2010, p. 03).
Eis o fato devidamente recortado segundo o ângulo de interesse da oligarquia: transformar amigos em inimigos, a partir do uso da força midiática que tem, para, ao final, derrotá-los pela incapacidade de unirem-se.
Em jornalismo chama-se de enquadramento, orientação editorial, o tom que as matérias recebem pelo periódico antes de ser publicada. Nada mais a esperar de O Estado do Maranhão senão essa angulação divisória das oposições: “ ‘O PPS resolveu romper as amarras que o mantinham preso àquele esquema que não leva a nada’. O ‘esquema’ é a coligação do PDT com o PSDB”...
Agora, com o testemunho de quem estava lá – e de quase duas mil pessoas outras – veja o fato real acontecido no discurso de José Reinaldo que, ao tomar a palavra, iniciou saudando Paulo Matos – presidente do PPS:
“Quero saudar aqui o Partido Popular Socialista na pessoa de seu presidente, na sua posição firme em estar conosco. Saibam que, antes dessa decisão, o Paulo recebeu DEZESSEIS TELEFONEMAS DA ROSEANA SARNEY, que queria a todo custo levar o PPS para sua coligação, que já tem 16 partidos! Por que tantos partidos? Isso tudo é medo de disputar com o Flávio o governo do Estado. Parabéns ao Paulo e ao PPS, por ter se livrado das amarras desse esquema que não leva a nada!”
Percebe, caro (a) leitor (a), o quanto se modifica o sentido ao se retirar a frase de seu contexto? E mais, ao incluir algo que não foi dito, a referência à coligação de Jackson Lago como aquela que “amarrava o PPS”?
E que diria se soubesse que Paulo Matos foi vaiado não por qualquer referência ao Jackson Lago, mas quando fez a defesa do candidato de seu partido à presidência, o tucano José Serra?
Mas o que manchetou O Estado?
“PCdoB e PSB LANÇAM DINO COM VAIAS AO GOVERNO LULA” (O Estado do MA, 01/07/2010, capa).
Pois é. E assim circulam centenas de exemplares do jornal, que repercutem em dezenas de rádios e blogues do sistema oligárquico de comunicação e, rapidamente, disseminam-se milhares de boatos cujo objetivo maior é intrigar os membros das oposições. Que, por sua vez, são tentados a trocar farpas e a responder entre si. O que, na prática, constrói um clima de inevitável desunião. Tudo o que a velha oligarquia quer!
Cuidado aos líderes das oposições para não se matarem entre si e deixarem o inimigo principal vivo, leve e solto, pois como diz Norberto Bobbio: “são os conflitos em que, confrontados os contendores como inimigos, a vita mea é a mors tua !
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Artigo publicado no Jornal Pequeno, edição de 05/07/2010
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