domingo, 6 de setembro de 2015

100 DIAS DE GREVE NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS

Entre as duas campanhas, qualquer semelhança não é mera coincidência


Franklin Douglas (*) 

A greve nas universidades federais completou, nesta semana que passou, 100 dias de paralisação. Com poucos dias a menos que os técnicos-administrativos em educação, os professores também mantêm o movimento paredista. Na UFRJ, a greve chegou a ser decretada até por estudantes. A greve nas universidades federais evidencia dois fatos: o engodo do lema do governo federal PÁTRIA EDUCADORA; e, no plano local, o fim de uma alardeada capacidade gerencial do reitor Natalino Salgado.
No plano federal, a “presidenta” que ganhou a eleição, em outubro de 2014, não foi a que tomou posse, em janeiro de 2015. O programa trazido ao Planalto não foi o anunciado na campanha; o ministro da Economia, um gerente do capital financeiro, não foi o que se prometeu no pleito; o lema PÁTRIA EDUCADORA não passou de uma peça de marketing para ofuscar outro já inalcançado, PAÍS RICO É PAÍS SEM POBREZA. Nem a pobreza acabou, nem a educação tornou-se uma prioridade da Pátria, com Dilma Rousseff.
Eis o motivo da crise nas universidades federais: o governo optou pelo pagamento dos juros da dívida; o governo preferiu aumentar a taxa de juros; o governou optou pelos ricos, em seu segundo mandato!
E na lógica dos ricos, educação de qualidade é para poucos dos seus. Aos demais, basta um curso profissionalizante no PRONATEC! Nada de pensar crítico, de formação cultural sólida. No Brasil, parece que ainda estamos nos tempos da formação do trabalhador à moda do apertar parafusos, como satirizou Charles Chaplin, em seu filme “Tempos Modernos”.
Se a crise no país é econômica e de gestão, na UFMA, a crise é, sobretudo, de gestão. A principal crise na UFMA é da reputação do reitor, de sua imagem como gestor público e seu legado naquela universidade.
Antes de trombetear em toda a mídia a crise da UFMA, Natalino, em 12 dias de campanha, para eleger sua sucessora à reitoria, não falava em crise. Ao contrário, vendia uma UFMA dos sonhos: prometia um Restaurante Universitário em dois andares; Centros de Estudos climatizados, a exemplo dos Centros de Ciências Sociais-CCSo e de Ciências Humanas-CCH (onde há turmas cujo calor das 14 horas, e os mosquitos à noite, torna sofrível qualquer aula); garantia a reforma dos campi do continente; estruturaria os cursos de Medicina, em Pinheiro, e o BCT, em São Luís... tudo conversa fiada! Passada a eleição, a coisa mudou da água para o vinho!
Qualquer semelhança entre a campanha de Lula para Dilma e de Natalino para Nair não é mera coincidência! Foram forjadas num plano fora da realidade.
Lulista até o último fio de cabelo (nos tempos bons do lulo-petismo!), embora com raízes no PSDB, o reitor Salgado não trastejou em cuspir no prato que comeu. Em coletiva com a imprensa, colocou toda a culpa da crise da UFMA na crise do governo federal. Muito fácil!
Expôs os cortes na receita orçamentária, mas não tornou público onde estão suas despesas e a quem deve. A crise da reitoria é a crise de demissão entre os terceirizados? Faltou dizer que boa parte deles é empregada sob o clientelismo, e não por concurso público... Faltou recurso para concluir as obras? Deixou de dizer que, só para o prédio de Odontologia, foi disponibilizado, já após a anunciada crise, um adicional de mais um milhão de reais para terminar um prédio para o qual já recebeu recurso suficiente para ter concluído... Não disse se cortou as verbas de viagens e diárias da administração da UFMA...
Como na fábula recontada por Jean de La Fontaine, “A Cigarra e a Formiga”, ao invés de se preparar para os “tempos difíceis do inverno”, a Cigarra da UFMA preferiu cantar a si própria na mídia local, nos “tempos fáceis do verão”.
Da situação calamitosa da UFMA, resta uma das duas opções ao quase ex-reitor: (1) ou faltou competência para prever a situação econômica de arrocho; (2) ou gastou mal o que não tinha. Em qualquer das hipóteses: foi-se a imagem de bom administrador! Eis a verdadeira crise temida por Salgado.
NEM A “AGENDA BRASIL” DE RENAN-LEVY, NEM A “AGENDA SALGADA” DE SAÍDA DA CRISE INTERESSAM PARA A VERDADEIRA DEFESA DA EDUCAÇÃO PÚBLICA E DA UFMA.

Nesses 100 dias de greve, é para essa situação que técnicos e docentes têm buscado, a todo momento, chamar a atenção da sociedade. Anestesiados pelo marketing eleitoral e pela interdição do debate dentro e fora da UFMA, a comunidade não se apercebeu do que acontecia. Agora, sobressaltados com a realidade, só resta uma saída para que a greve não chegue a 200 dias de paralisação: ampliar o apoio à defesa da universidade pública e aos professores e técnicos, exigindo do governo federal proposta concreta ao movimento e do ainda reitor da UFMA que abra sua planilha de despesas à sociedade. NEGOCIAÇÃO SÉRIA E TRANSPARÊNCIA: LÁ E CÁ!

(*)  Franklin Douglas - jornalista e professor, doutorando em Políticas Públicas (UFMA), escreve ao Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Publicado na edição de 06/09/2015, opinião.