domingo, 29 de abril de 2012

NO ASSASSINATO DE DÉCIO SÁ, A OLIGARQUIA ESTÁ EM XEQUE


Franklin Douglas (*)


O assassinato do jornalista Décio Sá foi covarde, bárbaro, violento. Não se deseja uma morte dessas ao pior inimigo. Foi a expressão máxima de que a pistolagem impera no Maranhão, não tem respeito sequer pela elite política oligárquica que, com leniência, deixou que ela florescesse.
Ligado diretamente a Fernando Sarney, a Ricardo Murad e muito bem quisto pelo patriarca da oligarquia e por sua filha-governadora, a pistolagem não tomou conhecimento dessas ligações: ousou matar Décio Sá, cuja oligarquia que ele tanto defendeu sequer conseguiu protegê-lo.
Conheci Décio no curso de Comunicação Social. Embora um ano a minha frente, formamos na mesma turma. Na UFMA, posicionávamos em grupos estudantis diferentes, contudo, ambos sob influência das teses progressistas da esquerda forjada na universidade. Era essa a cultura política predominante na UFMA dos anos 1990. Fora do espaço de resistência da universidade, a cultura política hegemônica era o clientelismo, o patrimonialismo, o mandonismo. Ao invés de resistir, inclusive por sua origem de classe, Décio optou por tornar-se um orgânico militante da classe dominante maranhense. Viu por esse caminho a via mais rápida para ascender no jornalismo, primeiro na Folha de São Paulo, depois n´O Estado do Maranhão.
Pioneiro na blogosfera, incorporou a lógica da produção noticiosa da internet e postava freneticamente, o que lhe deu público crescente, ainda que isso custasse a reputação de muitos, a intimidação de alguns (a exemplo do que fez com a reportagem da Folha quando esta veio verificar denúncias de compra de votos nas eleições de 2010) ou a exposição da vida privada de outros. Seu único limite era o núcleo da família Sarney-Murad ao qual se vinculou.
Fruto dessa formação social à qual se submeteu, Décio Sá imaginou-se intocável. Por isso, sob o interesse de seu grupo, foi a ponta de lança da oposição midiática aos governos Zé Reinaldo e Jackson Lago, enfrentou a Vale, denunciou empresários playboys, lideranças periféricas do sarneismo que foram e voltaram – a quem rotulou de “balaios” –, juízes, desembargadores, alguns crimes de pistolagem...
Nossas divergências com a opção política de Décio não impediram de evitar que ele levasse uma surra da turma do atual vice-governador, num encontro do PT, em 2005. Enfurecido pelos textos que Décio publicava das ramificações do escândalo do mensalão com seu grupo no PT maranhense, Washington expulsou-lhe do auditório do Hotel Praiamar, insultando-lhe de “imprensa marron” ao microfone, o que levou a formar no meio do auditório uma espécie de corredor polonês que Décio só escapou graças à intervenção de Augusto Lobato, Márcio Jardim e nossa lhe retirando do recinto – os mesmos que ele não poupou em “detonar”, como dizia, em seus textos. Com seus erros e acertos, era de carne e osso, nem santo, nem demônio...
Só a forte cobrança da opinião pública maranhense obrigará o sistema de segurança pública a dar resposta ao assassinato do jornalista Décio Sá, tal como ocorreu no caso "Stênio Mendonça", na década de 1990.
Independe da qualidade e da opção ideológica do jornalismo feito por Décio, é obrigação de todos nós a exigência pela elucidação do crime, pois se trata de uma vida humana barbaramente ceifada, do direito à liberdade de expressão (de todos! E não apenas da liberdade da imprensa poder falar), de encorajar jornalistas a não calarem e afastar deles – e da sociedade – a cultura do medo, de silenciar por receio de represálias.
Só a cobrança da sociedade, repito, obrigará a oligarquia a cortar na própria carne, como foi obrigada a fazer na CPI do Narcotráfico/Crime Organizado. Sobretudo porque a violência é estrutural, criada e incorporada ao sistema político pela elite política que o conformou nos últimos 50 anos. Ontem foi o líder quilombola Flaviano Pinto (em São João Batista) e trabalhador rural Raimundo Alves “Cabeça” (de Buriticupu), hoje o jornalista Décio Sá... amanhã poderá ser qualquer um, se os maranhenses se calarem.
O que está na berlinda é a política de segurança pública do “melhor governo da vida” de Roseana, onde a pistolagem e a impunidade reinam à solta: só neste mês de abril foram 53 homicídios na ilha de São Luís. Praticamente dois assassinatos por dia!
Pautar um falso debate sobre “gorilas diplomados” é querer levantar uma cortina de fumaça diante da falta de aparelhagem/estrutura/pessoal da Polícia para chegar ao mandante do crime...
As metralhadoras da oligarquia deveriam mirar a investigação sobre o mandante do crime, ao invés da defesa truculenta da mesma, que quer tutelar a OAB, impondo quem deve e quem não deve dirigir suas comissões internas, ou quer impedir até o direito de opinião dos que não concordam com sua visão do Maranhão.
Não é a cidadania maranhense que está em xeque, tampouco a mulher ou o homem de bem, como você caro leitor, cara leitora. Quem está em xeque é a oligarquia!
Não à pistolagem!! Não à impunidade!!!

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(*) Franklin Douglas - 
jornalista e professor, e
screve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Artigo publicado no Jornal Pequeno (edição 29/04/2012, página 16)

Carta Capital: A SANGUE FRIO

A sangue frio

Nem jornalista protegido da família Sarney está imune à pistolagem no estado.

Por Matheus Pichonelli





O ar-condicionado do plenário Nagib Haickel não arrefecia a tensão entre os deputados maranhenses reunidos na sessão de quarta-feira 25. Dedos em riste, levavam para a sala climatizada a temperatura de uma manhã quente e abafada, típica do outono em São Luis. O motivo era a votação de um projeto para batizar uma avenida da cidade com o nome de Jackson Lago, o ex-governador morto no ano passado e que durante anos combateu a família Sarney – um projeto que em qualquer outra parte do mundo seria tema para vereadores, e não deputados.
O blog do jornalista Décio Sá, morto na sexta-feira 23
A aprovação da homenagem seria uma afronta ao padroeiro, representado ali pela base aliada da filha, a governadora Roseana (PMDB), e pelas palavras de sua lavra cravadas na parede frontal do plenário: “Não há democracia sem Parlamento livre – José Sarney”.
Não parecia o mesmo plenário que, um dia antes, levou praticamente toda a Assembleia Legislativa do Maranhão a vociferar contra o ato de barbárie cometido contra Décio Sá, o blogueiro mais conhecido do Maranhão – e, até a noite de segunda-feira 23, um jornalista praticamente intocável.
O crime acontece exatos 15 anos após a morte de um delegado, Stênio Mendonça, que chocou a população maranhense e deu início à CPI do Crime Organizado – e anos depois resultou em prisões e na cassação de deputados maranhenses. Pura ironia: foi durante a cobertura da CPI que Décio e outros jornalistas da mesma geração, formados na metade dos anos 1990 na Universidade Federal do Maranhão, consolidaram o nome da mídia local.
A indignação dos deputados deu espaço, no dia seguinte, à acalorada discussão sobre o nome da avenida. Aquela bolha de ar climatizado a tapear a alta temperatura afora era só o primeiro sinal do descompasso entre a realidade e a política da região.
Uma volta de dez minutos por São Luis é suficiente para perceber que havia assuntos mais urgentes a serem discutidas no plenário: da saída do aeroporto até a avenida Litorânea, onde o jornalista foi alvejado, o índice de desenvolvimento humano oscila como se o veículo circulasse entre o Sudão e a Suécia em poucos minutos.
Fora do belo prédio espelhado da Assembleia, a preocupação não era com os nomes a serem colocados na avenida: era a ação de grupos de extermínio a um estado já assolado pela miséria e insegurança.
O estado emprega um policial para cada grupo de 800 habitantes (a média brasileira é de um para 300). No campo, onde a atuação policial é ainda mais limitada, a situação chega a ser assustadora: nas contas da Comissão Pastoral da Terra, nada menos do que 85 pessoas estão hoje ameaçadas de morte em razão de conflitos agrários em 29 municípios. No estado, 121 pessoas foram assassinadas desde 1985. Até hoje, apenas dois casos foram julgados, e nenhum dos mandantes está preso.

Crimes por encomenda. O caso de Décio se somou a uma série de assassinatos ocorridos desde outubro do ano passado. Naquele mês, um empresário foi morto por reagir a uma tentativa de grilagem de um terreno de sua propriedade numa das áreas mais valorizadas de São Luis. Com um tiro na nuca, foi encontrado enterrado numa cova rasa aberta em seu próprio terreno.
Pouco depois, dois irmãos, empresários de um grupo petroquímico, foram mortos por um motoqueiro que fugiu. Cerca de 15 dias atrás, um suposto traficante conhecido como Rato 8 (em referência aos oito assassinados dos quais era suspeito) morreu numa emboscada montada por homens armados dentro de um carro a cortar a mesma avenida onde Décio seria alvejado.
Outro crime da série foi registrado no município de Buriticupu, onde o líder rural Raimundo Borges foi morto com cinco tiros disparados por um motoqueiro. Em nenhum caso os mandantes ou executores foram presos, embora a polícia garanta que as investigações estejam avançando.
“Isso virou uma prática comum. Agora todos se deram conta da situação porque aconteceu com o Décio, uma pessoa conhecida da cidade”, afirma Diogo Cabral, advogado da CPT e secretário da Comissão de Direitos Humanos da seccional maranhense da Ordem dos Advogados do Brasil.
Dessa vez os tiros acertaram um aliado do grupo que se reveza no poder do estado há pelo menos 40 anos. Décio Sá era notadamente um jornalista alinhado com a família Sarney – à boca pequena, colegas contam que ele era o único jornalista do estado a ter acesso à área VIP de Roseana Sarney na Sapucaí durante o desfile em homenagem a São Luis feito pela escola samba Beija-Flor.
Ex-correspondente da Folha de S.Paulo e depois colunista de O Estado do Maranhão, o diário da família Sarney, Décio colecionava inimigos devido à exposição de uma certa incontinência verbal em seu blog, um dos primeiros do estado. Por causa dele, transformou-se em persona non grata em muitos círculos – que, no Maranhão, se agrupam de forma bem delineada entre os amigos e inimigos dos Sarney.
No ano passado, não ousava aparecer na Assembleia Legislativa, onde policiais em greve acampavam como protesto. De sua trincheira, Décio emendava petardos em direção aos grevistas, que podiam ver o diabo na frente, mas não o blogueiro. Da mesma forma, evitou acompanhar o resultado da eleição para governador em 2006, quando Jackson Lago foi eleito. Do lado de fora do Tribunal Regional Eleitoral, cabos eleitorais prometiam uma surra no blogueiro caso aparecesse.
O jornalista Wilson Lima, repórter do portal iG e ex-correspondente de diversos veículos no Maranhão, conta que Décio era personagem até de charges publicadas nos jornais locais. Tudo por conta de seu perfil perfil “folclórico”. Numa delas, era retratado como um “homem-bomba” – um de seus bordões, ao fechar uma apuração, era que iria “detonar” determinado alvo.
Recentemente, Décio comprou briga até com os ex-colegas da Folha, atuando, segundo relato do próprio jornal, para derrubar a pauta dos repórteres que desembarcavam na capital maranhense em busca de noticias contra a família Sarney.
Em seis anos, se aproximou como pode do clã, mas colecionou inimizades pontuais a cada novo post. Nesse tempo, ele comprou briga até com cego que não era cego – quando revelou que um funcionário do Tribunal de Justiça havia passado em concurso na cota de deficientes alegando ser cego, o que Décio jurava de pé junto não ser verdade.
Décio era, segundo os colegas, uma pessoa bem relacionada mas de poucos amigos. Costumava ir para os bares sozinho para tomar suas long necks e estender o expediente por meio de telefonemas que só cessavam na madrugada. Um de seus favoritos era o Bar Estrela do Mar, onde foi morto. Ali, entre um telefonema e outro, ele costumava digladiar com as patas de caranguejos servidos com vinagrete e arroz de toicinho.

Medo. A reportagem de CartaCapital visitou o bar 36 horas após o crime. Apesar do clima de tranquilidade, ninguém ali parecia disposto a falar sobre o caso: a atendente baixava a cabeça, sem olhar para o repórter, quando questionada em qual mesa Décio estava sentado quando morreu. Em plena hora do almoço, o restaurante, um simpático quiosque aos pés da praia, estava vazio. O único movimento era de curiosos a diminuírem a velocidade ao passar pela avenida – e o alvoroço dos funcionários ao se reunir em frente ao aparelho de tevê para ver a fachada do estabelecimento estampada no noticiário.
Casqueiro (a versão maranhense para “marrento”), como descrevem os colegas, Décio não relatou, nos últimos dias, qualquer menção às ameaças. Estava acostumado a desdenhar os comentários mais acirrados que recebia em sua página eletrônica.
Décio tinha as costas quentes. Prova do prestígio do jornalista, capa dos principais jornais do Maranhão no dia seguinte, é que minutos após os disparos, o Bar Estrela do Mar já estava cercado de jornalistas e autoridades, entre elas o próprio secretário de Segurança Pública, Aluisio Mendes. A promessa de revide veio poucas horas depois, quando, dizendo-se chocada, Roseana prometeu capturar os autores do “ato de barbaridade”. Recuperando-se de cirurgia em São Paulo, Sarney pai também se manifestou. Mesmo convalescente, condenou a atrocidade (ele não citou as demais vítimas do desmando no estado) e declarou: o crime “atentava contra a democracia”.
Desmoralizada, a polícia prometeu um prêmio de cem mil reais para quem encontrasse o autor dos disparos. Não explicitou o assassino deveria ser encontrado vivo ou morto.

Conflitos de terra. Queima de arquivo, vingança, “bode expiatório”. O que não faltam, em São Luis, são palpites sobre as razões do assassinato. Em seus últimos posts, o blogueiro havia noticiado irregularidades na prefeitura de Turilândia, a prisão de assessores do Tribunal de Justiça, irregularidades em prefeituras do interior e a suposta participação de parlamentares em exploração sexual.
Mas a hipótese mais provável, levantada pelos próprios colegas de trabalho, é que a morte esteja relacionada indiretamente ao universo dos conflitos agrários. Dias antes de ser morto, Décio havia publicado reportagens contra um empresário de Barra do Corda, cidade do interior maranhense, suspeito de assassinar um líder rural. O empresário é filho do prefeito da cidade e iria a júri se não fosse uma estranha notícia publicada na véspera pelo blogueiro: quase todos os integrantes do júri eram ligados à família do acusado.
A publicação, com nome e “parentesco” dos jurados, melou o julgamento, afinal transferido para a capital – onde imagina-se que o empresário terá menos chances de sair ileso.
Quando foi atingido, Décio falava ao telefone com o vice-prefeito de Barra do Corda, Aristides Milhomem. Não parecia preocupado com possíveis ameaças: sentado numa cadeira do corredor próximo ao banheiro, estava desprevenido, de costas para a avenida, à espera de dois amigos: o também blogueiro Luis Cardoso (anti-Sarney) e o suplente de vereador Fábio Câmara, assessor da secretaria de Saúde do Maranhão. Entretido ao telefone, Décio não deu importância ao sujeito que desceu de uma moto à sua procura. Sem capuz ou óculos escuros, o que leva a polícia a suspeitar de que fosse um forasteiro, o assassino percorreu o corredor estreito do bar e conferiu onde estava o alvo. Passou por ele na ida ao banheiro. Na volta, deixou a encomenda: seis tiros disparados com uma pistola calibre 40, de uso da polícia. Em seguida, fugiu a pé, protegido pela ausência de câmeras de monitoramento ou policiamento.
Para despistar, cortou os barrancos de areia que serpenteiam a avenida e escondem os luxuosos prédios de uma área nobre encravada num bolsão de pobreza. Por ali, as únicas testemunhas eram um grupo de evangélicos a rezar no morro àquela hora da noite.
Ao saberem do burburinho sobre a morte do blogueiro, a reação de vários colegas foi a mesma: pegaram o telefone para tentar checar a notícia com a própria fonte.
Foram longos minutos em que o aparelho, de uso pessoal, vibrou e berrou em vão numa mesa do restaurante: aos 42 anos, Décio estava ao chão, com o rosto e o peito cravejado de tiros.
Morreu em combate: em uma das mãos, um outro celular, usado para trabalho, estava colado ao ouvido.

Instinto. A morte a tiros do jornalista, dentro de um bar de uma das mais movimentadas vias de São Luis, deixou desnorteado o grupo de repórteres políticos da região. A sensação, resumida por um deles, era: “se ele, que era querido pelos Sarney, morreu, imagine nós”.
O medo uniu, talvez pela primeira vez, sarneyzistas e oposição.
Marco Aurélio D’Eça, blogueiro e colunista político de O Estado, conviveu com Décio nos tempos de juventude, no bairro João Paulo, e, anos mais tarde, na faculdade, nas redações e bares para ouvir rock às sextas-feiras. As esposas são amigas e tiveram filhos na mesma época – a mulher de Décio está grávida novamente.
Segundo D’Eça, a morte do colega deixou em alerta o grupo de blogueiros do estado, formado por cerca de dez profissionais que, sozinhos e com estilo próprio (embora ligados a seus grupos), somam mais audiência que qualquer publicação local.
“Vou te dizer: estou com muito medo”, diz o jornalista. “No jornal, nunca recebi processos. No blog, em poucos anos já recebi cinco. Sem contar as ameaças: gente dizendo que sabe quem você é, o que faz, onde anda.”
Apesar do medo, Gilberto Léda, também blogueiro e repórter de política, é quem resume o espírito da imprensa maranhense após o golpe: “Todos estamos assustados, nossos amigos e familiares pedem para a gente ter cautela. Mas a tendência é não desanimar. Quando a gente escolhe essa profissão, sabe dos riscos. Corremos riscos por puro instinto”.
No Maranhão, em que pese a influência das oligarquias no jornalismo, este instinto é quase um ato de coragem: os assassinos, estejam onde estiverem, estão soltos, protegidos e prontos para a próxima.

terça-feira, 24 de abril de 2012

NÃO À PISTOLAGEM! NÃO À IMPUNIDADE!!!


Décio Sá
Décio Sá (1970-2012)
Só a forte cobrança da opinião pública maranhense obrigará o sistema de segurança pública a dar resposta ao assassinato do jornalista Décio Sá, tal como ocorreu no caso "Stênio Mendonça", na década de 1990.



Isso independe da qualidade e da opção ideológica do jornalismo feito por Décio: trata-se da vida humana, do direito à liberdade de expressão, de encorajar jornalistas a não calarem e afastar deles - e da sociedade - a cultura do medo, de silenciar por receio de represálias.


Só a cobrança da sociedade, repito, obrigará a oligarquia a cortar na própria carne, como foi obrigada a fazer na CPI do Narcotráfico/Crime Organizado. Sobretudo porque a violência é estrutural, criada e incorporada ao sistema político pela elite política que o conformou nos últimos 50 anos. Ontem foi o trabalhador rural "Cabeça", de Buriticupu, hoje o jornalista Décio Sá... amanhã poderá ser qualquer um, se os maranhenses se calarem.

Não à pistolagem! Não à impunidade!!

Abaixo, texto do Blog do Pedrosa, com o qual tem concordância acerca do fato:


"O jornalista Décio Sá foi assassinado brutalmente, ontem à noite, por volta das 22:30 h. Estava jantando, no bar "Estrela do Mar, na Avenida Litorânea. Certamente foi alvo de um pistoleiro de aluguel.
Décio deveria ter muitos inimigos pessoais, devido ao seu estilo de jornalismo, pouco preocupado com a ética.  
Ele simplesmente vendia serviços jornalísticos e mantinha como orientação apenas a defesa dos Governos do grupo Sarney. Quem não coubesse dentro dessa orientação geral, simplesmente era perseguido e desmantelado moralmente, a seu bel prazer. Fora isso, as situações, onde o manejo das versões poderia ser negociado. Diga-se de passagem: a verdade nunca foi o seu forte.
Apesar disso, mantinha talvez o blogue mais acessado no Estado, onde reunia o conjunto mais completo de informações jornalísticas. A sua morte talvez desvende o que ocorre nos bastidores de um tipo de mídia no Estado.
Apesar das dívidas morais, Décio Sá não deveria estar preocupado, menosprezando um ataque físico de seus inimigos. Perambulava tranquilamente pela cidade e foi morto num lugar público.
O que mais espanta é a forma como foi morto - não apenas a morte em si. Duas pessoas numa moto. Um, desce do veículo, atravessa a avenida e vai buscar sua vítima, sentado numa mesa de bar. Friamente, sem discussão ou diálogo, atira, cinco vezes, certeiramente. Três tiros atingem a cabeça do jornalista, que, certamente, tombou morto. Um principiante não conseguiria fazer esse tipo de serviço.
O manejo com uma pistola .40 foi facilitado pela proximidade do alvo, mas não descarta o controle emocional, alcançado pela experiência de situações semelhantes.
Serviços como esses não saem barato. O mandante tem dinheiro. Arrisco até a dizer que quem manda matar jornalista tem uma preocupação exacerbada com sua imagem pessoal. É alguém que depende da sua imagem para atuar - econômica ou politicamente.
Arrisco também a dizer que talvez o blogue de Décio não seja a fonte privilegiada para encontrar o culpado pelo crime. É provável que a eliminação física tivesse por objetivo impedir uma determinada postagem. Nesse caso, o sigilo telefônico também pode ser um caminho.
O fato é que Décio morre reafirmando o que todos nós sabíamos: o Maranhão não é um Estado seguro para se viver.
Espero que o clamor da classe jornalística exerça a pressão necessária sobre os órgão de segurança e os assassinos e seus mandantes sejam presos."

domingo, 22 de abril de 2012

Qual deve ser a área prioritária de atuação do Ministério Público Federal. Deixe sua opinião aqui



O Ministério Público Federal (MPF) realiza, nesta terça-feira, das 14 às 18 horas, consulta pública sobre sua atuação.

Pretende ouvir cidadãos, cidadãs, organizações da sociedade civil, movimentos, sobre em qual área deve aprimorar sua ação.


A consulta pública do Ministério Público Federal será no Auditório da Procuradoria da República no Maranhão, que fica na avenida Senador Vitorino Freire, 52 -  Bairro Areinha.

Ecos das Lutas dá sua contribuição à consulta através da enquete no blogue: "Na sua opinião, em quais áreas o Ministério Público Federal deve aprimorar sua atuação de fiscalização?

Vote em até 03 opções, dentre:

1 - Combate à corrupção e ao crime organizado;

2 - Direito do consumidor;

3 - Proteção ao meio ambiente;

4 - Defesa do patrimônio cultural, público e social;

5 - Garantia dos direitos das populações indígenas, tradicionais e minorias;

6 - Aplicação dos recursos na área de Educação;

7 - Aplicação dos recursos na área de Saúde. 

domingo, 15 de abril de 2012

25 ANO$ DA TV MIRANTE

A Constituição proíbe, mas Roseana e Sarney Filho
           são donos da TV Mirante, junto com Fernando Sarney
Franklin Douglas (*)



A televisão é um instrumento de manutenção de poder político, econômico e ideológico. Nesta última característica, realçamos: a televisão consolida a visão de mundo que as pessoas/telespectadores têm da realidade que as cerca, das ideias sobre esse mundo. E, como dizia o velho Marx, as ideias dominantes em uma dada época, são as ideias da classe dominante.
Comunicólogo de vasto estudo sobre cultura e comunicação, Albino Rubim nos mostra que, diferente da Europa e dos Estados Unidos, onde a sociedade passou pela etapa da oralidade, depois ao domínio da escrita e, posteriormente, à etapa do audiovisual, o que tende a diminuir o impacto da influência da televisão na população desses países, no Brasil, passamos do oral ao audiovisual sem termos cumprido a etapa do domínio da escrita. Consequência: numa sociedade de amplo analfabetismo funcional, a imagem da TV é o principal mecanismo de compreensão do mundo. O que passa na “telinha” tende a ser entendido como verdade.
Não por outro motivo, o controle desse veículo de comunicação foi alvo imediato dos políticos e empresários a eles ligados, muitas das vezes sob a forma de “laranjas” (donos no papel, mas não de fato). Também, não por acaso, do segundo mandato presidencial de Getúlio Vargas (1951) – época da chegada da televisão ao País – até o governo de Luís Inácio Lula da Silva (2003-2010), as formas de concessão de canais de televisão sofreram alterações quase imperceptíveis em seu modelo de funcionamento.
No Brasil, seis famílias/grupos concentram a rede nacional de produção e distribuição de produtos midiáticos do veículo: Marinho (Globo), Silvio Santos (SBT), Sirotski (RBS), Saad (Bandeirantes), Igreja Universal (Record) e Marcelo de Carvalho (Rede TV).
No Maranhão, do início, com Raimundo Bacelar (1963), aos tempos atuais, a televisão é tão concentradora quanto as redes nacionais. Cinco famílias e uma única opção política, o sarneismo: Mirante/Globo – família Sarney (proprietários: Sarney Filho, deputado federal, Roseana Sarney, governadora e Fernando Sarney); Difusora/SBT – família Lobão (proprietários: Edison Lobão, ministro, Edison Lobão Filho, senador, Nice Lobão, deputada federal); TV Maranhense/Bandeirantes – família Ribeiro (proprietário: Manoel Ribeiro, deputado estadual); Cidade/Rede TV – família Vieira da Silva; TV São Luís/Record– família Zildene Falcão. A TVE/TV Brasil – do Governo Federal – é controlada no Maranhão pela oligarquia, como quase todos os cargos federais no estado. O que se alastra pelo interior do Estado em permissionárias e retransmissoras não foge aos núcleos locais de apoio do sistema central de poder, salvo raras exceções.
Se não fôssemos políticos não teríamos necessidade de ter meios de comunicação”, confessa um crime à Constituição um José Sarney despudorado, em entrevista à Revista Carta Capital, de novembro de 2005.
 O artigo 54 da Constituição Federal estabelece que senadores e deputados federais não podem “firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público; não podem exercer cargo, função ou emprego remunerado nestas entidades”; desde a posse, não podem “ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada”. E o artigo 55 estabelece que perderá o mandato o senador ou deputado “que infringir qualquer das proibições estabelecidas no artigo anterior”.
“Segundo a Transparência Brasil, 21% dos senadores e 10% dos deputados federais são concessionários de rádio e TV – sem contar aqueles que têm empresas em nome de familiares ou laranjas. Até o atual Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, já afirmou que ‘é mais fácil fazer o impeachment do presidente da República do que impedir a renovação de uma concessão de rádio ou TV’ ”, lembram os pesquisadores Valério Brittus e Luciano Gallas (site Observatório do Direito à Comunicação, agosto de 2008).
Algo semelhante disse a atual governadora do Maranhão, quando perguntada por que sua família não tomara antes a concessão da Rede Globo no Maranhão da família Bacelar e da TV Difusora: “Não é fácil tomar a televisão de um senador”.
Eis a lógica da oligarquia na criação da TV Mirante há 25 anos (foi fundada em 15 de março de 1987): (1) criar seu próprio sistema de TV; (2) enfraquecer política e economicamente um grupo aliado, para dele (3) tomar a concessão da maior emissora do País no Estado (em 1º de fevereiro de 1991, Magno Bacelar, sem mandato e sem dinheiro, repassou a concessão da Globo em São Luís da TV Difusora para a TV Mirante – já o tinha feito o mesmo antes em Imperatriz); e utilizar esse veículo para (4) exercer o controle do debate público e (5) enriquecer às custas dos cofres do públicos.
O professor Carlos Agostinho Couto, em sua tese de doutorado, calcula que, no primeiro momento em que controlou o Governo do Maranhão (1995-2002), Roseana Sarney, como governadora, transferiu mais de 79 milhões de reais das contas públicas para as contas particulares do Sistema Mirante, de propriedade dos sócios, frisamos, Fernando Sarney, Sarney Filho e a própria Roseana Sarney. Em ambos os lados da mesa de negociação, a mesma família nos negócios de comunicação. Com apenas o Governo do Estado, a Mirante e os Sarneys faturam o que 93% das empresas do Maranhão não conseguem obter de receita o ano todo!
Se não fossem políticos não teriam necessidade de ter meios de comunicação... Na verdade, se não tivessem meios de comunicação justamente por serem políticos, não enriqueceriam tão rápido pelos negócios da comunicação!

Em tempo: Mais que um instrumento, a mídia moderna é uma relação social. Nesse contexto, pode haver sim profissionais que trabalham nesse veículo mas não estão à serviço de sua lógica. Assim como, em dados momentos, para legitimar-se, essa mesma mídia excludente denuncia absurdos, como corretamente o fez em relação aos 18 salários dos deputados maranhenses. Nada surpreendente, mesmo vindo da Globo, a denúncia, ou a defesa do indefensável, por parte dos deputados roseanistas. Surpresa foi a reação dos deputados da oposição. Ao invés da denúncia corajosa, “pérolas” como estas: “Há presunção de legalidade” – Rubens Júnior (PCdoB), “Defendo as prerrogativas do deputado” – Bira do Pindaré (PT), “Tem mês que chega a faltar” – Neto Evangelista (PSDB), “Muitas vezes nós tiramos do nosso próprio salário pra servir à população” – Graça Paz (do PDT castelista) ... Não seria o inverso? Tiram do povo para servir ao próprio bolso? Eis porque denomino essa oposição de consentida: é fácil de ser desmoralizada pela oligarquia que, por isso, consente que seja essa a sua oposição. É a oposição dos sonhos de qualquer oligarquia!



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(*) Franklin Douglas - 
jornalista e professor, e
screve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Artigo publicado no Jornal Pequeno (edição 15/04/2012, página 16)