Franklin Douglas (*)
Não vivemos num
sistema parlamentarista. No Brasil, crises agudas econômicas, de popularidade ou
de governabilidade não se resolvem com um voto de desconfiança no Parlamento,
que resulta em convocação de novas eleições. Aqui, sobram três saídas: a exaustão do governo, o impeachment constitucional ou o golpismo.
Em 1964, as
forças conservadoras civis e militares optaram pelo golpe de Estado contra o
trabalhista João Goulart. No fim da década de 1980, quase todas as correntes
políticas esgotaram o governo Sarney até onde puderam. Em 1992, as forças
progressistas impuseram o impeachment ao corrupto Collor de Mello.
Em 2015, o
impasse na escolha de uma dessas três alternativas para dar cabo ao governo
Dilma não está nas ruas. Com 71% de rejeição, segundo a última pesquisa do
Instituto DataFolha, Dilma conseguiu reunir contra si os eleitores de seu
adversário no segundo turno de 2014 e boa parte de seus próprios eleitores, que
se sentem traídos pelas políticas que jurou que não faria, nem que a vaca
tossisse... Perdeu a confiança popular!
O impasse para solucionar o destino do fim
do governo Dilma está na elite política do País. Encontra-se nas incertezas que
pairam sob as duas principais forças políticas: o tucanato e o petismo.
O tucanato
paulista prefere o derretimento político do governo, pois só vê em si a
capacidade de dirigir o país, a partir do que sempre se considerou ser: São
Paulo, a locomotiva do país. Enfraquecer o governo agora para derrotá-lo em
2016 e 2018. O tucanato mineiro aposta no impeachment já, pois crê que o caminho natural dos rios
da insatisfação popular será o mar aecista. Não há 2018 para Aécio Neves frente
à unidade de Alckmin-Serra-FHC por um candidato paulista do PSDB à Presidência
da República.
No petismo, a
dúvida não é o que fazer com José Dirceu, mas o que fazer com Lula. O primeiro,
agora transformado em guerrilheiro da propina, o PT já entregou aos leões da
Lava Jato; já com Lula, a dúvida é: colocá-lo em campanha desde já, assumindo a
Casa Civil ou qualquer outro ministério no governo federal, para tornar-se
articulador político de fato do governo, e também ganhar foro privilegiado para
protegê-lo das denúncias do Petrolão; ou preservá-lo para o embate eleitoral
mais à frente...
Observe, cara leitora,
caro leitor, em qualquer das hipóteses, acabou a autoridade de Dilma como
presidente! Seu único lastro são as forças econômicas que, para lhe manter o
apoio, exigirão cada vez mais e mais o ajuste sob a única neoliberal do
mercado. E, quanto mais ajuste neoliberal, mais crise econômica, e mais crise
política, e mais crise de governabilidade, e... esgotamento de seu governo ou impeachment ou golpe.
Marx em seu “O
18 Brumário de Luis Bonaparte (1852)” ou Gramsci em seus “Cadernos do Cárcere
(1926-1937)” já demostraram que, nos momentos em que as forças antagônicas são
incapazes de expressar a vontade coletiva que emerge na sociedade, forças
marginais ou forças auxiliares a essas principais podem tornar-se efetivas em
razão da debilidade construtiva das forças fundamentais.
Eis por onde podem
entrar em cena o PMDB de Renan, Cunha, Temer, Sarney... ou movimentos do tipo
Brasil Livre, NasRuas, etc... Ou as mobilizações convocadas por movimentos
sociais como MST, sindicatos e suas centrais sindicais, etc.
A resultante
desse embate real pode ser reacionária ou progressista: o processo está em
aberto. E pode, até, resultar em golpe, não exatamente com baionetas e tanques
de guerra nas ruas, não necessariamente inconstitucional: lembremo-nos de um
passado recente no Maranhão, o golpe judiciário no mandato do governador
Jackson Lago. Foi feito por dentro do ordenamento jurídico. De artimanhas políticas,
o Maranhão é cheio de exemplos!
O petismo está
tão perdido nesse cenário, que o início de um esboço de reação, de fazer a
Dilma percorrer o país inaugurando obras, começa por uma vinda dela ao
Maranhão! Chegará num estado onde as ideias parecem estar fora do lugar.
Aqui, o
governador comunista, que tem como vice um tucano, lhe promete defesa de um
mandato presidencial para o qual não fez campanha no segundo turno de 2014...
Aqui, um
ex-tucano, que chama a esquerda socialista de maluca, ocupa o partido...
socialista! E é um dos mais próximos à turma que quer apear a “socialista”
Dilma do poder...
Aqui, o dono do
PDT é o mesmo que falava nos quatro cantos do Maranhão que jamais votaria no PT
porque onde o Sarney estivesse, ele estaria do outro lado, mas, ganha a eleição
pelos petistas, foi o primeiro a apresentar-se como um dos líderes do governo
ao qual seu partido, esta semana, decidiu declarar independência, sem entregar
o ministério que ocupa...
Aqui, é o estado
onde, a qualquer pretexto, a visita de Dilma ao governo ao qual o PMDB local faz
oposição sistemática, o sarneismo pode utilizar-se para deixar de ser o fiador
do que resta de apoio ao governo no PMDB nacional e jogar a pá de cal no
mandato de Rousseff... Está ou não está perdida a “presidenta” Dilma?
Às forças que desejam uma saída progressista
para a crise, caberia construir um arco de aliança em torno de uma nova agenda
econômica e por direitos (até mesmo o direito de cada eleitor revogar o mandato
de político que, após eleito, abandona o programa e as propostas que prometeu
cumprir, por que não?), mas isto o petismo majoritário e domesticado, envolto
aos escândalos de corrupção, tem medo e se comporta apenas como aquele que,
como dizia Gramsci, vê a crise como a expressão de uma situação na qual o velho morre e
o novo não pode nascer.
Ocorre que,
frente ao envelhecimento precoce do petismo, o que pode estar para nascer não é
nada novo, mas algo ainda mais velho e em restauração aos tempos anteriores ao
lulo-petismo!
Eis o que parece
ser o fim dessa política do
PT. Não há mais como sustentar o engodo!
(*) Franklin Douglas - jornalista e professor, doutorando em Políticas Públicas (UFMA), escreve ao Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Publicado na edição de 09/08/2015, opinião.