segunda-feira, 1 de abril de 2019

TORTURA NUNCA MAIS!



Franklin Douglas (*)

Cara leitora, caro leitor, permito-lhe pular a leitura dos três próximos parágrafos deste artigo: são realmente desumanos os casos relatados... Trata-se de registros cruéis do que foi a prática da tortura no tempo da ditadura civil-militar no Brasil (1964-1985), no seu período mais duro. São registros feitos no livro “Brasil Nunca Mais” (da Arquidiocese de São Paulo), coletados pela Comissão Nacional da Verdade e depoimentos levados ao ar, ao final de cada capítulo da novela “Amor e Revolução”, no ano de 2011. Dos quais, destaco estes:


Exemplo 1 de tortura pela Ditadura, uma atrocidade – Depoimento de Jarbas Marques na televisão, ao final da novela citada: ele foi torturado nu, com cobra e um jacaré de 1m20cm. Foi usado como cobaia em aula de tortura. Viu uma barata ser colocada na vagina de uma mulher, que estava sendo torturada no pau de arara. Viu um preso enlouquecer com as torturas tendo desvio de coprofagia (comia as próprias fezes). Sofreu tortura sexual e teve éter introduzido no ânus: “
A sensação do éter no ânus é que eu ia ter um edema de glote, por que minha língua inchou que parecia a língua de um boi...Antes de qualquer reação, pense, caro/a leitor/a: esse torturado poderia ter sido seu pai!





Exemplo 2 de tortura pela Ditadura, uma monstruosidade – Depoimento de Maria Amélia Teles: torturada por Brilhante Ustra (aquele militar, exaltado pelo presidente Bolsonaro), ela foi à chamada “cadeira de dragão”, uma cadeira de ferro, onde se amarrava a pessoa por braços e pernas e se aplicava eletrochoques de 220 volts, com eletrodos e fios elétricos nos órgãos genitais, orelhas, nariz. Ela sofreu tortura física, sexual e psicológica: “Trouxeram meus filhos para me ver. E um deles, de cinco anos, perguntou por que eu estava com a cor azul... eu, na verdade, estava toda roxa, após uma noite toda de tortura, com choque elétrico no ânus, na vagina, na boca... estava cheia de hematomas...Antes de qualquer reação, pense, caro/a leitor/a: essa torturada poderia ter sido sua mãe!





Exemplo 3 de tortura pela Ditadura, uma barbaridade – Depoimento de Derlei Catarina de Luca - PRESA POR ENGANO! Foi torturada, dias e noites, no pau de arara, com choques elétricos, porque achavam que ela seria uma procurada pelo regime, a agitadora Maria Aparecida Costa. Danrlei não era “terrorista”, não era filiada a partido, não militava contra o regime... Apenas foi confundida com outra pessoa... “
Recebi muitos choques... só parou quando desconfiaram que eu não seria a pessoa que procuravam e decidiram averiguar a minha documentação com as minhas impressões digitais... só aí concluíram que tinham se enganado...Antes de qualquer reação, pense, caro/a leitor/a: essa torturada poderia ter sido sua filha, sua irmã!







Fico nesses três brutais exemplos, apenas para tentar chamar a atenção dos que não leram, ouviram falar ou não têm qualquer conhecimento desse período ocorrido no Brasil e ficam a propagar sem noção um “viva à Ditadura Militar!”

Nesse período, de 30 a 50 mil pessoas foram presas ilicitamente e torturadas (o instrumento do
habeas corpus foi extinto nesse período); 4.841 pessoas punidas com a perda de direitos políticos, aposentados, demitidos do trabalho; 3.783 funcionários públicos foram perseguidos e demitidos ou compulsoriamente aposentados, dos quais 72 professores e 61 pesquisadores de nossas universidades.

De tais números e diversos casos, um dele foi reconhecido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que concluiu pela condenação do Estado brasileiro pela tortura e morte do jornalista Vladimir Herzog, assassinado nas dependências do DOI/CODI, centro de tortura em São Paulo.

Por tudo isso e muito mais, o 31 de março de 1964, na verdade, o golpe militar de 1º de abril de 1964, o Dia da Mentira (mas ficaria uma piada pronta, no primeiro de abril se aplicar um golpe militar sob o argumento de que se estava salvando a democracia no País!!), não pode ser exaltado, comemorado ou rememorado sob a ótica defendida pelo presidente da República Jair Bolsonaro. Seria um escárnio com a vida desses milhares de torturados e perseguidos pela Ditadura Militar.

Três vivas, sim: à Defensoria Pública da União! À juíza federal Ivani Silva da Luz!! Às 19 seções estaduais do Ministério Público Federal que repudiaram essa tentativa de comemoração do golpe contra nosso Estado Democrático de Direito. A primeira entrou com ação civil pública contestando a moralidade e legalidade do ato presidencial. A segunda deu razão e deferiu favoravelmente o pedido da DPU. A nota dos 19 MPF´s nos estados (entre os quais está o do Maranhão e, vejam, não está o do Paraná, da operação Lavajato...), a convicção de que há vozes contrárias às ações que desconstruam nosso pacto democrático e nossa Constituição de 1988.

Ações relevantes, por estamos num tempo em que é preciso, para que não se esqueça de e para que nunca mais aconteça, dizer bem alto: DITADURA NUNCA MAIS!!!





(*) Franklin Douglas – professor e doutor em Políticas Públicas.
E-mail: franklin.artigos@gmail.com

Nenhum comentário: