A verdade - a única que se pode ter até o momento sobre este caso - é que o ambiente de impunidade e degeneração política vivido hoje no Maranhão tem mais responsabilidade na morte de Décio Sá, do que os possíveis disparos de Jhonathan de Sousa Silva. Em entrevista ao jornal Vias de Fato, publicada em janeiro de 2010, Manoel da Conceição, histórico e respeitado líder político brasileiro, disse que “o domínio de Sarney ajudou a degenerar o Maranhão”. Indagado se esta não seria uma situação nacional, ele respondeu que aqui estamos vivendo uma situação diferente. Segundo ele, “com Sarney a pobreza do Maranhão não é só econômica, mas também política. É a pobreza ideológica. Essa degeneração, para mim, é o que ficará de pior”. As declarações do velho e sábio Mané têm uma relação direta com o assunto anunciado no título deste editorial. O assassinato de Décio Sá repercutiu nacionalmente, o que obrigou José Sarney, atual presidente do Senado e poderoso chefe da oligarquia maranhense, a assumir uma posição pública diante do crime. Primeiro, ele visitou o túmulo do jornalista, acompanhado de uma equipe de seu império de comunicação (o Sistema Mirante), num gesto de demagogia e hipocrisia explícitas, que repercutiu muito mal, principalmente nas redes sociais. Ele também tratou do assunto em vários artigos publicados em seu jornal (O Estado do Maranhão). Num deles, citou uma declaração de sua filha e correligionária, a governadora Roseana: “aqui não é lugar para bandidos e vamos caçá-los e puni-los com todo rigor”. Em seguida, neste mesmo artigo, Sarney afirmou que, “no seu primeiro governo, Roseana desmontou a quadrilha de roubo de cargas e agora vai desmontar essa”. Tudo conversa fiada... Cinismo puro! Logo após o crime que deu fim a vida de Décio Sá, virou senso comum no Maranhão - e especificamente em São Luís - a afirmação de que o jornalista teria sido vítima do próprio grupo para o qual trabalhava. Teria sido alvo de alguém com poder político e/ou econômico. De algum bandido rico (ou de um bando) que age a partir da degeneração, cuidadosamente mantida por José Sarney, como bem citou Manoel da Conceição. Hoje, ainda existe uma versão oficial da polícia (governo Roseana) sobre o caso. Como é de conhecimento público, a investigação, feita numa velocidade pouco comum, concluiu que o crime teria ocorrido a mando de uma quadrilha de agiotas que atua junto a prefeituras do interior do Estado. Os agiotas citados mantêm relações com membros dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário do Maranhão. Enfim, com gente que serve aos interesses estratégicos do grupo comandado exatamente pelo atual presidente do Senado brasileiro. Dias depois de anunciada a solução do caso, surge o nome de Raimundo Cutrim, deputado estadual e ex-secretário de segurança nos três primeiros governos de Roseana. Seu nome aparece depois que vazou o depoimento de Jhonathan de Sousa Silva, o mesmo que confessou ter executado Décio. Segundo as palavras do pistoleiro, colhidas pela polícia, Cutrim seria “o principal mandante”. Diante da natural repercussão da notícia, Roseana se apressou em dizer que seu antigo aliado “é inocente”, enquanto o jornal dela (O Estado do Maranhão), numa clara insinuação contra Cutrim, anuncia que a polícia estadual pode reabrir três inquéritos que tratam de assassinatos não resolvidos e ocorridos em Imperatriz, São Bento e Presidente Vargas. No meio disso, existe a inimizade pública entre Cutrim e o atual secretário de segurança, Aluísio Mendes. Uma briga que chegou ao seu ponto máximo (por enquanto) após um discurso de Cutrim na Assembleia onde ele "caiu de porra", chamou Aluísio de moleque e disse que o depoimento de Jhonathan “foi montado”. Apesar do tom bastante agressivo e das sérias acusações, em seu discurso Cutrim preferiu “esquecer” (pelo menos por enquanto) o fato de que seu inimigo esteve junto com Fernando Sarney, no escandaloso inquérito da Operação Boi Barrica... Fernando é irmão de Roseana, sócio dela no Sistema Mirante, que inclui o jornal O Estado do Maranhão, o antigo local de trabalho de Décio. Além desta pandemia que se revela também a partir de figuras ligadas ao Sistema de Segurança, lembramos que em 2010, Roseana Sarney - que hoje tem a cara-de-pau de dizer que “o Maranhão não é terra de bandido” - foi eleita com o apoio da maioria absoluta dos prefeitos do Estado. Vários deles ligados aos tais agiotas, numa relação que todo o meio político maranhense estava cansado de saber, muito antes do assassinato de Décio... Mas, no que se refere aos prefeitos que apoiaram Roseana, a relação deles com esse tipo de criminosos sempre foi, para o grupo de seu pai, algo absolutamente irrelevante. Natural, até. Estamos falando de uma engrenagem que sempre funcionou assim: se o prefeito é corrupto, enrolado com a Justiça, ou mesmo com a Polícia, mas vota em Roseana, ele pode ficar no cargo e agir livremente... O padrão é o de Bia Venâncio, prefeita de Paço do Lumiar, que recentemente tentou se converter em cabo eleitoral de Adriano Sarney, “antigo morador” do Maiobão que, “nas suas férias”, foi flagrado em Brasília fazendo agiotagem no Senado, sob a proteção do seu vovô... (Adriano é filho do deputado federal Zequinha Sarney, um falso ecologista, correligionário de madeireiros e escravocratas). Mas, se ao contrário de Bia, um prefeito qualquer não se ajoelhar para a grande máfia local, ele é perseguido e pode ser cassado. Todo mundo sabe disso no Maranhão! E essa situação imoral também vale para o Poder Legislativo, onde alguns parlamentares/quadrilheiros (mas eleitores de Roseana) sempre tiveram cobertura para agir, contando inclusive, da mesma forma que os prefeitos, com a ajuda de decisões judiciais. E isso não é de hoje! Não é novidade! Ao longo de anos, o voto na filha deste coronel que sobrevive ao século XXI, é a maior de todas as imunidades para um “político” do Maranhão... Essa é a regra! Este, então, era o ambiente em que Décio Sá transitava na sua rotina de trabalho. Ia da Assembleia Legislativa para os tribunais, da sede do Sistema Mirante para a “Casa Grande”, sempre próximo a prefeitos, desembargadores, conselheiros, secretários de estado, ricos agiotas, colunistas sociais, deputados, senadores, empresários que vivem de licitações fraudadas, enfim, no mesmo habitat daqueles que hoje são acusados de terem lhe matado. Décio Sá, a vítima deste caso, não entendeu (ou não quis entender) todas as contradições e periculosidades do esquema para o qual trabalhava e do meio em que circulava com aparente desenvoltura. Este polêmico profissional da imprensa, equivocadamente, sentia-se protegido pelos que estavam no topo desta pirâmide... E assim ele seguiu, com seu estilo até certo ponto atrevido e em muitos casos inconsequente. Com as opções que fez na sua profissão, estaria bem mais seguro se fizesse a cobertura jornalística da Penitenciária de Pedrinhas... Pois lá, não estão os bandidos mais perigosos do Maranhão... Entre os criminosos condenados, longe dos tapetes do poder ou dos bailes de gala do governo, não se encontra o ambiente social mais degradante e degenerado do nosso estado... Na cadeia, não estão os facínoras e os picaretas que há anos comandam e assaltam as nossas instituições públicas... A verdade - a única que se pode ter até o momento sobre este caso - é que o ambiente de impunidade e degeneração política vivido hoje no Maranhão tem mais responsabilidade na morte de Décio Sá, do que os possíveis disparos de Jhonathan de Sousa Silva. |
sexta-feira, 29 de junho de 2012
Editorial Vias de Fato: Uma verdade sobre o assassinato de Décio Sá
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