Franklin Douglas (*)
Não foram pelos presentes tipo bolsa Victor Hugo, perfume Channel, sapatos Arezzo ou escovinha
permanente que o 8 de Março se
tornou o Dia Internacional da Mulher.
Isso tudo pode até fazer parte, afinal quem delas não gostaria de, neste dia, ser
presenteada?
A lógica do capitalismo é tudo mercantilizar. Até mesmo uma data em que
mulheres operárias rebelaram-se exatamente contra esse sistema que as oprimia,
impondo, por exemplo, uma jornada de trabalho de 16 horas diárias.
Foi por conta de uma greve, na qual reivindicavam a redução da jornada
de trabalho para 10 horas por dia (!) que 130 tecelãs foram carbonizadas. Além
da redução da jornada de trabalho, elas lutavam pela equiparação salarial
(ganhavam um terço do salário dos homens pelo mesmo trabalho realizado) e
ambiente digno de trabalho.
Reprimidas violentamente, trancadas e queimadas dentro da fábrica, em
Nova Iorque, no dia 8 de março de 1857, essas operárias morreram nesse dia, mas
a luta das mulheres nasceu com força e para nunca mais regredir.
E foi o movimento de mulheres, ligado às organizações operárias e
partidos socialistas, que propôs, em 1910, a data como dia internacional da
luta das mulheres. O que somente viria a ser reconhecido pela Organização das
Nações Unidas (ONU) no ano de 1975.
Esse detalhe fundamental, a cada ano é propositalmente esquecido por
dois equívocos: (1) de conduzir um conjunto de debates, reflexões e
comemorações que reforçam a luta feminista como uma luta apenas das mulheres e,
sobretudo, como a luta que prevaleceria sobre qualquer outra na transformação
da sociedade; e (2) de que esse processo é supraclassista.
A gênese do capitalismo se confunde com o patriarcalismo, o machismo, a
violência à mulher e sua opressão. Uma sociedade que se quer diferente, uma
sociedade livre, socialista, por exemplo, não tem lugar para machismo, opressão
feminina. Se há machismo em sociedades socialistas, é porque não há socialismo
autêntico nessas sociedades.
E não se transforma uma sociedade sem um projeto macro, antagônico,
oposto ao que prevalece como status quo. Por isso, ensina o
filósofo húngaro István Mészáros: “nenhuma ‘questão única’ pode,
realisticamente, ser considerada a ‘única questão’”.
Não é só o feminismo, não é só o ambientalismo, não é só o combate ao
racismo, a “questão única” que pode conduzir à “única questão” que é a
superação do capitalismo.
A compreensão de que a luta das mulheres é suficiente redunda em
situações como estas: As injustiças contra os direitos das mulheres foram
debeladas porque simplesmente temos UMA DESEMBARGADORA PRESIDENTE do Tribunal
de Justiça? A vida da mulher maranhense melhorou simplesmente por termos UMA
GOVERNADORA no Maranhão? Ou, pelo fato de termos UMA PRESIDENTA, a situação da
mulher brasileira avançou em sua representação política nos demais poderes? E
assim se multiplicam os exemplos que mostram que não basta ser mulher, é
preciso ter compromisso com o lado mais sofrido e oprimido da condição
feminina.
Eis porque não se emancipam mulheres sem que se emancipem junto com
elas também os homens!
Para além do sentimento corporativista, a luta da mulher deve ser a
luta por uma sociedade que liberte mulheres e homens da miséria, das
desigualdades, da opressão, da exploração. E isso exige posição.
Comemorações do 8 de março que juntam da mulher do agronegócio à mulher
camponesa, da mulher capitalista à mulher operária, etc., não são mais do que
ações que contribuem para tornar o Dia Internacional da Mulher um geleia geral,
que descontrói todo o valor de luta pelo qual nasceu há 157 anos, pela
resistência das operárias de Nova Iorque.
Maria Aragão, por exemplo, foi uma das maiores expressões dessa
concepção. Sua luta é referenciada até hoje.
Como Maria, à luta mulheres, mas
com classe!
E, inspirado em Bertoldo Brecht, diria:
“Há mulheres que lutam um dia e
são boas;
Há outras que lutam um ano e
são melhores;
Há as que lutam muitos anos e são
muito boas;
Mas há as que lutam toda a vida,
E estas são imprescindíveis!”
Às queridas leitoras, parabéns pelo Dia Internacional da Mulher.
(*) Franklin Douglas - jornalista e professor, doutorando em Políticas Públicas (UFMA), escreve ao Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Publicado na edição de 09/03/2014, opinião - p. 03
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