Um urubu, um avião,
várias vidas em risco e R$ 143 milhões de multa. Eis o resumo de 23 anos – até
o momento – da disputa judicial entre o Ministério Público do Estado (MPE), o
Governo do Maranhão e a Prefeitura de São Luís em torno do Aterro da Ribeira, a
possível causa do incidente noticiado no último final de semana de colisão
entre um avião da companhia aérea Latam e um urubu.
A petição inicial do
processo é de 29 de abril de 1997. Fora o tempo do inquérito civil promovido
pelo MPE, de 21 de maio de 1996.
O quis diz a Infraero?
Que há riscos para a aviação que ocorre em virtude do desequilíbrio causado
pela operação irregular do Aterro da Ribeira, que provoca uma concentração de
urubus na área, a qual está próxima ao cone de aproximação de pouso, usado em
90% das operações de voo do Aeroporto Marechal Cunha Machado.
O caso do “Aterro da Ribeira” me chamou a
atenção como estudioso do direito ambiental. A lide se prorroga no tempo, mesmo
já tendo sentença judicial proferida e confirmada pelo Tribunal de Justiça do
Maranhão. O processo tem peculiaridades surpreendentes, entre as quais:
a) levou 6 anos para definir um perito e
ter um laudo pericial – somente concluso em 2002;
b) ficou perdido por 4 anos dentro de uma
caixa de arquivo;
c) só teve sentença proferida 11 anos
depois de protocolada;
d) a sentença transitou em julgado em 18 de
novembro de 2009, mas 11 depois o cumprimento da sentença se arrasta, o que
levou o juízo do caso a decretar uma multa de R$ 143.000,00 (centro e quarenta
e três milhões reais) para obrigar Prefeitura e Governo a cumprirem a sentença a
qual foram condenados.
E o que determina a sentença?
Considerando válidos os argumentos do MPE e
o laudo pericial, constatando que o sistema de tratamento de enxofre é ineficaz,
o não funcionamento do aterro como sanitário, a desobediência à Resolução
4/1995 do CONAMA e a falta de manutenção de distância de 7,4 km de aterros em
relação a cones de aproximação de aeroportos, a sentença determina:
1. A anulação do Estudo de Impacto
Ambiental e de todo o processo de licenciamento do aterro;
2. A obrigação ao Estado do Maranhão de não
conceder licença de operação ao aterro;
3. A imposição à Prefeitura de São Luís da
elaboração de uma auditoria ambiental, de um novo Estudo de Impacto Ambiental e
da construção de novo aterro sanitário fora do cone de aproximação das
aeronaves.
O Governo do
Estado recorre da multa de 143 milhões. A Prefeitura de São Luís não cumpre uma
determinação do poder judiciário.
Será preciso mesmo um acidente no aeroporto
de São Luís, vitimando passageiros e população moradora do entorno do Aeroporto
Cunha Machado para o poder público tomar as providências devidas?
Como pesquisador e docente, tenho a
obrigação de trazer a público essas informações do processo do “Aterro da
Ribeira”, a fim de sensibilizar opinião pública e autoridades para a gravidade
da situação.
Como ser humano, torço para que eu nunca
tenha que dizer, frente a uma catástrofe anunciada como essa, “eu avisei”...
Que esse processo não chegue às bodas de
prata. E que não tenhamos nenhuma colisão entre um urubu e um avião, nenhuma
vida em risco e nenhuma multa milionária sendo imposta para o Poder Público cumprir
o seu dever, para apenas fazer a coisa certa!
(*) Franklin Douglas – professor e doutor em Políticas
Públicas. E-mail: franklin.artigos@gmail.com
Artigo publicano no jornal O Estado do Maranhão (05/03/2020, p. 04 - opinião)
Artigo publicano no jornal O Estado do Maranhão (05/03/2020, p. 04 - opinião)
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