Karl Marx: 1818-1883 |
Discurso de
Engels no funeral de Karl Marx
“Em 14
de março, quando faltam 15 minutos para as 3 horas da tarde, deixou de pensar o
maior pensador do presente. Ficou sozinho por escassos dois minutos, e sucedeu
de encontramos ele em sua poltrona dormindo serenamente — dessa vez para
sempre. O que o proletariado militante da Europa e da América, o que a ciência
histórica perdeu com a perda desse homem é impossível avaliar. Logo
evidenciará-se a lacuna que a morte desse formidável espírito abriu.
Assim como Darwin em relação a lei do
desenvolvimento dos organismos naturais, descobriu Marx a lei do
desenvolvimento da História humana: o simples fato, escondido sobre crescente
manto ideológico, de que os homens reclamam antes de tudo comida, bebida,
moradia e vestuário, antes de poderem praticar a política, ciência, arte,
religião, etc.; que portanto a produção imediata de víveres e com isso o
correspondente estágio econômico de um povo ou de uma época constitui o
fundamento a parir do qual as instituições políticas, as instituições
jurídicas, a arte e mesmo as noções religiosas do povo em questão se
desenvolve, na ordem em elas devem ser explicadas – e não ao contrário como nós
até então fazíamos.
Isso não é tudo. Marx descobriu também a
lei específica que governa o presente modo de produção capitalista e a
sociedade burguesa por ele criada. Com a descoberta da mais-valia iluminaram-se
subitamente esses problemas, enquanto que todas as investigações passadas,
tanto dos economistas burgueses quanto dos críticos socialistas, perderam-se na
obscuridade. Duas descobertas tais deviam a uma vida bastar. Já é feliz aquele
que faz somente uma delas. Mas em cada área isolada que Marx conduzia pesquisa,
e estas pesquisas eram feitas em muitas áreas, nunca superficialmente, em cada
área, inclusive na matemática, ele fez descobertas singulares.
Tal era o homem de ciência. Mas isso não
era nem de perto a metade do homem. A ciência era para Marx um impulso
histórico, uma força revolucionária. Por muito que ele podia ficar claramente
contente com um novo conhecimento em alguma ciência teórica, cuja utilização
prática talvez ainda não se revelasse – um tipo inteiramente diferente de
contentamento ele experimentava, quando tratava-se de um conhecimento que
exercia imediatamente uma mudança na indústria, e no desenvolvimento histórica
em geral. Assim por exemplo ele acompanhava meticulosamente os avanços de
pesquisa na área de eletricidade, e recentemente ainda aquelas de Marc Deprez.
Pois Marx era antes de tudo revolucionário.
Contribuir, de um ou outro modo,
com a queda da sociedade capitalista e de suas instituições estatais,
contribuir com a emancipação do moderno proletariado, que primeiramente devia
tomar consciência de sua posição e de seus anseios, consciência das condições
de sua emancipação – essa era sua verdadeira missão em vida. O conflito era seu
elemento. E ele combateu com uma paixão, com uma obstinação, com um êxito, como
poucos tiveram. Seu trabalho no 'Rheinische Zeitung' (1842), no parisiense
'Vorwärts' (1844), no 'Brüsseler Deutsche Zeitung' (1847), no 'Neue Rheinische
Zeitung' (1848-9), no 'New York Tribune' (1852-61) – junto com um grande volume
de panfletos de luta, trabalho em organização de Paris, Bruxelas e Londres, e
por fim a criação da grande Associação Internacional de Trabalhadores coroando
o conjunto – em verdade, isso tudo era de novo um resultado que deixaria
orgulhoso seu criador, ainda que não tivesse feito mais nada.
E por
isso era Marx o mais odiado e mais caluniado homem de seu tempo. Governantes,
absolutistas ou republicanos, exilavam-no. Burgueses, conservadores ou
ultra-democratas, competiam em caluniar-lhe. Ele desvencilhava-se de tudo isso
como se fosse uma teia de aranha, ignorava, só respondia quando era máxima a
necessidade. E ele faleceu reverenciado, amado, pranteado por milhões de
companheiros trabalhadores revolucionários – das minas da Sibéria, em toda
parte da Europa e América, até a Califórnia – e eu me atrevo a dizer: ainda que
ele tenha tido vários adversários, dificilmente teve algum inimigo pessoal. Seu
nome atravessará os séculos, bem como sua obra!”
Friedrich Engels.
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