Franklin Douglas (*)
É evidente que você deve saber que os motoristas e cobradores de São Luís têm uma das mais difíceis cargas de trabalho:
a) o stress de dirigir um ônibus velho, sob um calor insuportável, num trânsito desorganizado e de engarrafamentos constantes;
b) a necessidade de cumprir o rigoroso tempo do trajeto da linha, dentro de uma jornada de trabalho diária de inacreditáveis 7 horas e 20 minutos;
c) a pressão psicológica de trabalhar sob a possibilidade de assalto a qualquer momento, de quebrar o ônibus nos buracos das ruas da cidade e ainda ser obrigado a ter que pagar pela peça danificada;
d) a saúde em risco, sobretudo com problemas na coluna e no sistema auditivo, dentre outros aspectos relacionados ao trabalho deles.
Por tudo isso e um pouco mais, não há dúvida: a reivindicação salarial dos rodoviários é legítima, correta e justa.
Desonesta é a utilização de uma categoria por parte dos patrões para pleitear o aumento das tarifas de ônibus!
Sim, porque, por comparação, conclua você mesmo:
Greve dos professores universitários - após dois anos de tentativas de negociar uma pauta junto ao governo federal, os professores das Universidades Públicas são obrigados a decretar greve. Ato contínuo, o governo Dilma tenta criar uma agenda para abafar o movimento: por medida provisória concede um “aumento” ao professor com doutorado, fora os descontos, que varia de R$ 100,73 (ao docente com 20 horas) a R$ 293,35 (ao docente com dedicação exclusiva), anuncia mudanças no ENEM etc. Embora mobilize 43 das 48 universidades cujos professores estão filiados ao Sindicato Nacional (ANDES), é um silêncio geral... O patrão, no caso o governo federal, joga duro. Os professores terão que realizar muitas atividades para pressionar o governo e chamar a atenção da sociedade.
Greve dos motoristas - na primeira semana, muita mobilização das lideranças sindicais para conseguir realizar assembleias participativas, inicia-se o movimento sob dificuldades como, por exemplo, ser obrigado a manter 50% dos ônibus circulando e desconfiança da base ante as conseqüências, num sentimento geralmente majoritário nessa categoria, de que não se deve arriscar muito, pois ruim com o pouco salário, pior sem o emprego... Mas, da primeira a segunda semana, essa base radicaliza, rejeita os 7% de aumento (índice maior do que o conseguido pelos metroviários de São Paulo) e decide paralisar 100% dos ônibus; todas as garagens dos mais de 1.000 ônibus de São Luís são fechadas – uma mobilização daquelas dos tempos da CUT dos sindicalistas barbudos dos anos 80! Estranhamente, não há incômodo, tampouco represália do setor patronal.
A greve é dos motoristas ou dos donos das empresas, caro leitor, cara leitora?
Há ou não há um acordo velado pelo aumento de passagens?
Enquanto hoje a Prefeitura diz não ter nada a ver com a greve, como se política de transportes públicos não fosse responsabilidade do governo municipal, em fevereiro de 2010, o prefeito João Castelo soube arbitrar o aumento das passagens em 22%! E o fez em pleno carnaval. O usuário, ainda ressacado da folia, nem conseguiu reagir. Em maio daquele ano, os motoristas engoliram o aumento arbitrado e ponto final à greve.
Pois bem: nesse sui generis movimento grevista, onde motorista e donos de empresa param os transportes da cidade, justiça do trabalho diz uma coisa num dia e se desdiz no dia seguinte, quem paga a conta é a população, para variar!
Mobilizemo-nos! O principal é derrotar a ganância dos empresários. NADA DE AUMENTO DE PASSAGENS. Em seguida, está a luta pela criação de uma empresa pública de transportes. A sociedade não pode fica a mercê de uma iniciativa privada atrasada e ineficiente como essa das empresas de ônibus e seus veículos velhos, lotados, de passagens caras e lucro fácil.
Em São Paulo, o sistema de transportes com empresa pública obrigou o Governo a intervir e equacionar a greve. Durou um dia. Em São Luís, sem sistema público e sem governo, vamos a mais uma semana de greve dos donos das empresas... E sem ônibus... Sem comércio faturando... Sem aulas nas escolas e universidades...
Uma alternativa pública de transportes é urgente!
(*) Franklin Douglas - jornalista e professor, escreve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Artigo publicado no Jornal Pequeno (edição 27/05/2012, página 16)
Nenhum comentário:
Postar um comentário