segunda-feira, 17 de setembro de 2012

“PORRADA NA MOÇADA” NUNCA MAIS

Praça Deodoro: palco da mobilização pela meia-passagem em 79


  Franklin Douglas (*) 

Neste dia, 17 de setembro de 2012, a luta pela meia-passagem em São Luís completa 33 anos. Em artigo publicado no Jornal Pequeno de 16 de setembro de 2004 (A greve de 79 e o grito sufocado), relembrei os 25 anos da luta estudantil pela meia-passagem, um dos grandes momentos registrados na História maranhense:
Iniciada pelos universitários, revoltados com o aumento de passagens concedido de surpresa pela Prefeitura de São Luís, a greve conquistou apoio de secundaristas, professores, trabalhadores e se constituiu numa espécie de "Maio de 68" da juventude maranhense. A greve de 79 explica-se mais pelo que denominaríamos de grito sufocado do que pela reivindicação em si ao direito à meia-passagem.
Em pleno tempo de Ditadura, o conjunto da sociedade vinha de um ciclo de altíssima repressão ao movimento social, com tortura, exílio e morte de muitas das lideranças democráticas do País. Sem a possibilidade de livre manifestação política, de liberdade de imprensa e direito à livre organização, o contexto motivou o apoio popular à bandeira estudantil. O apoio à meia-passagem representou um grito contra a censura, o regime militar, a carestia, o assassinato desenfreado de trabalhadores rurais na luta contra a grilagem de terras, a falta de moradia e de pão e feijão na mesa dos maranhenses!
(...) O momento histórico tornava o movimento estudantil a única expressão possível da sociedade maranhense sob o regime autoritário. A ponta de lança da luta pelo fim regime dos generais. Este grito sufocado ecoou na tribuna da Assembleia pelos discursos do então deputado estadual Haroldo Saboia, nas páginas do Jornal Pequeno a partir da intuição democrática de José Ribamar Bogéa, nas reuniões de mobilização do Pe. Marcos Passerini nos fundos da Igreja de São João, nos bairros por meio dos núcleos populares em ebulição mas, sobretudo nas ruas de São Luís através da garganta de cada estudante.
Tão grande quanto a mobilização da Greve de 1979 foi sua repressão. O caráter bipartidário da sociedade da época (MDB ou Arena) fez crer às autoridades de plantão (Governador João Castelo, Prefeito Mauro Fecury, reitor Cabral Marques) que o movimento não era outra coisa senão coisa dos comunistas!
Se mobilizar 35 mil pessoas nos dias de hoje já é algo extraordinário, imaginem na São Luís de quase três décadas atrás. Maior ainda a repressão a tantos. Pouquíssimos não registraram em suas memórias as bordoadas, cassetetes e chutes da Polícia Militar. Muito maior, contudo, a reação popular: quebra-quebra de ônibus, revolta nos bairros, mais mobilização. Uma pichação nos muros da UFMA revela bem ao ponto que a disputa chegara: meia-passagem ou meia cidade!”
Em 1981, ainda no chamado período pós-traumático da Greve de 79, movimento estudantil e popular mantinham a luta contra o aumento das passagens. Naquele ano, estudantes e populares ocuparam a Câmara Municipal a fim de impedir que os vereadores aprovassem o aumento das tarifas.
Vindo de uma audiência com o governador João Castelo, o presidente da Câmara dos Vereadores, Edivaldo Holanda, chegou anunciando que havia empenhado a palavra no Palácio dos Leões de que a Câmara seria desocupada, de qualquer jeito. À meia-noite, soldados isolaram a sede do Poder Legislativo municipal, à época onde funciona atualmente a JUCEMA, e fizeram uma espécie de corredor polonês de lá até a praça Benedito Leite. Após insistentes tentativas de negociação com o então deputado estadual Haroldo Saboia, o comandante encerrou conversas: “Deputado, chega de bate papo, agora é porrada na moçada!”. Quem sobreviveu também a essa “experiência”, e ainda está aí vivo, certamente lembra desse fato.
Como escrevi naquele artigo de 2004 “(...) a Greve de 79 enraizou no imaginário popular de São Luís a disposição de luta, de resistência e de ilha rebelde que os setores oposicionistas cultivam sobre a capital maranhense. Rememorar a cada ano esta conquista faz um bem danado à luta popular e à História do Maranhão, ainda que faça torcer o nariz dos donos do poder.
Esses registros nos servem para evidenciar o quanto a temática do transporte público está enraizada na população da capital, seja pela simbologia do que foi a maior conquista dos estudantes, a meia-passagem, seja por viver no dia a dia as dificuldades de um sistema falido de transporte.
São Luís tem memória. 33 anos depois, velhos personagens ou novos que já vêm envelhecidos, com suas propostas mirabolantes (VLT... GPS... BRT... Via Expressa...), ainda pensam que podem ludibriar a inteligência do cidadão e da cidadã da ilha rebelde.
Ledo engano. Nos tempos atuais, onde não existe mais a Ditadura dos Generais, não cabe mais “porrada na moçada”: nem com cassetete, nem com proposta mirabolante; nem nas ruas, nem nas urnas!


        
(*) Franklin Douglas - jornalista e professor, escreve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Artigo publicado no Jornal Pequeno (edição 16/09/2012, página 16)
Originalmente no artigo publicado no jornal impresso, iniciamos com o termo "Amanhã", alterado aqui no blog para "Nesta dia".

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