Franklin Douglas (*)
Vale a pena ler as "Notas sobre a questão agrária no
Maranhão", do historiador e professor da UFMA Wagner Cabral. Constituem
excelente instrumento de análise de nosso tempo atual maranhense. Nelas:
a) a compreensão da "fórmula 6+1", onde, no Maranhão, temos a
distribuição de seis bolsas famílias para cada um emprego gerado, fórmula que
sustenta o modelo de desenvolvimento sob controle do lulo-PMDB-petismo em nosso
estado;
b) o desvendamento do (fracassado) modelo maranhense sob o enclave econômico
"mina-rodovia-porto", onde minério, alumínio, ferro-gusa, soja e a monocultura
do agronegócio praticamente destruiu a agricultura familiar maranhense e
expulsou o homem do campo. De 1991 a 2010, a população economicamente ativa do
Maranhão caiu de 60,6% para 32,6% (eis o porquê de não produzirmos nem o
cheiro-verde de nosso caldo de peixe e a farinha anda tão cara!).
Wagner Cabral mostra os dados dos recursos destinados à agricultura
familiar e ao agronegócio, evidenciando que só o município de Balsas abocanhou
770 milhões de reais para produzir soja (para o mercado europeu, não para o
prato do maranhense), enquanto, em média, o agricultor familiar recebeu R$ 4
mil...
Nesse cenário, o professor nos alerta: "não é por acaso que tanto
a oligarquia Sarney (desde sempre), quanto setores da oposição estão flertando
abertamente com o agronegócio".
Ao que acrescento: oligarquia e oposição consentida são dois frutos
desse mesmo modelo. Veja que enquanto Roseana vai ao início da colheita da soja
no Baixo-Parnaíba, Flávio Dino vai a Balsas, em seus "Diálogos pelo
Maranhão", falar de produção de peixe com o Bispo responsável pela CPT
(Comissão Pastoral da Terra), mas nada sobre a monocultura da soja que dizima o
meio-ambiente do cerrado e o Baixo-Parnaíba no estado; nem uma palavra sobre os
39 conflitos por terra em Balsas (atrás apenas de Codó - 70 conflitos - e
Urbano Santos - 43 conflitos) ou trabalho escravo (Balsas, com seus 10 casos de
trabalho escravo, está entre os 19 municípios maranhenses que concentram 80% do
trabalho escravo no Maranhão). Não há diálogo entre latifúndio e a questão
agrária no Maranhão!
Wagner Cabral nos lembra ainda que o Maranhão é pela terceira vez
consecutiva o "campeão" em conflitos de terra no Brasil: 1.085
conflitos, entre 2003 e 2012, sob um INCRA nas mãos do PT e sob absoluto
controle da oligarquia Sarney. Vítimas desses conflitos: quilombolas,
indígenas, camponeses, comunidades tradicionais, jovens sob o jugo do trabalho
escravo... E arremata seriamente: "diante desse quadro, não basta falar da
relação visceral da oligarquia com esse modelo, mas também dos muitos "silêncios" da oposição..."
(Cabral, Wagner. Notas sobre questão agrária no Maranhão, 2013, acessível em
ecosdaslutas.blogspot.com, grifo nosso)
Registro meus parabéns à análise do professor Wagner Cabral. E deixo a
pergunta aos caros leitores e às caras leitoras: para subverter esse quadro,
vale tentar ganhar de qualquer jeito? É essa a oposição (consentida) que a "libertação
do Maranhão" merece?
Noberto Bobbio buscou, em seu Dicionário de Política, sintetizar os
diversos conceitos que giram em torno da política. Nessa obra, elaborada
conjuntamente com Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino, ele ensina que, na
luta pelo poder, quando a estrutura da sociedade entre em crise, entra em crise
também os princípios que a justificam, que fazem esse modelo de sociedade ser
aceito pela população.
Diz Bobbio: "caem também os véus ideológicos que camuflam ao povo
a realidade do poder, e se manifesta às claras sua inadequação para resolver os
problemas que amadurecem na sociedade. Neste momento, a consciência das massas
entra em contradição com a estrutura política da sociedade; todos se tornam
politicamente ativos, por serem simples as opções e por envolverem diretamente
as pessoas comuns; [nesse cenário] o poder de decisão se encontra, de fato, nas
mãos de todos" (BOBBIO et al, 1995, p. 678).
Ao não diferenciar-se em ideias, modelo de desenvolvimento, leque de
aliados políticos e respostas radicalmente diferentes das que foram dadas pela
oligarquia aos problemas da realidade maranhense, como esse do latifúndio, da monocultura
que sufoca a agricultura familiar, a oposição sob liderança de Flávio Dino não
se diferencia e apenas antecipa, ao não potencializar a contradição entre a
estrutura da sociedade e seu povo, a fim de torná-lo politicamente ativo porque
simples as escolhas, o que pode ser a crônica de uma derrota anunciada...
Fica a reflexão.
(*) Franklin Douglas - jornalista, professor e doutorando em Políticas Públicas (UFMA), escreve para o Jornal Pequeno aos domingos, quinzenalmente. Artigo publicado no Jornal Pequeno (edição 19/05/2013, p. 13)
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