Dom Flávio Giovenale(*)
Hoje, 10 de dezembro, Dia
Internacional dos Direitos Humanos, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB) e a Cáritas Brasileira lançam a campanha mundial contra a fome, a
pobreza e as desigualdades. Com o tema "Uma família humana, pão e justiça
para todas as pessoas", queremos sensibilizar e
mobilizar a sociedade sobre essas realidades responsáveis por grandes mazelas
no mundo e no Brasil. A campanha faz parte de uma mobilização mundial da
Caritas Internationalis, que articulou as 164 organizações membro para esse
grande movimento em favor da vida, dos direitos humanos e da justiça social.
O papa Francisco, em sua primeira exortação apostólica, chamou a atenção
ao dizer que "não se pode tolerar mais o fato de se lançar comida no lixo,
quando há pessoas que passam fome. Isso é desigualdade social. Assim como o
mandamento "não matar" põe um limite claro para assegurar o valor da
vida humana, também hoje devemos dizer "não a uma economia da exclusão e
da desigualdade social". Esta economia mata. Dessa forma, o Santo Padre
reafirma a opção da Igreja pelos empobrecidos e a urgente necessidade de
pararmos e prestarmos atenção à realidade que está em nossa volta.
A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) diz
que, hoje, 842 milhões de pessoas sofrem com a
fome no mundo,
ou seja, um em cada oito seres humanos não tem acesso a uma alimentação
adequada e de qualidade.
O Relatório da Riqueza Global, lançado este ano pelo banco suíço Credit
Suisse, afirma que, se a
riqueza produzida no mundo em 2013, que foi de US$ 241 trilhões, fosse
distribuída em partes iguais entre as pessoas adultas do planeta, cada um iria
receber US$ 56.600. Não podemos mais admitir esses dados: os 10% mais ricos controlam 86% da
riqueza global, enquanto apenas 32 milhões de adultos, em um mundo com 7
bilhões de habitantes, possuem 41% da riqueza mundial. Além disso, dois terços
dos adultos da humanidade — 3,2 bilhões — só conseguem dividir 3% da riqueza
mundial.
O Brasil, como muito se tem divulgado, é a sexta economia mais rica do mundo,
segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas 57 milhões de pessoas vivem em
estado de pobreza, ou seja, sobrevivem com meio salário mínimo. Mesmo
com programas de distribuição de renda promovidos pelo governo federal, como o
Bolsa Família, 20% dos
mais ricos ainda detém 63,8% da renda nacional, enquanto os 20% mais pobres acessam apenas 2,5% de
toda a riqueza que é produzida pelo país. O Atlas de Exclusão Social: os
ricos no Brasil mostra que o país tem mais de 51
milhões de famílias, mas somente 5 mil apropriam-se de 45% de toda a riqueza e renda nacional.
É fato que o Brasil tirou milhões de brasileiros da extrema pobreza, mas
em que condições? É aceitável definir a pobreza a partir de uma quantidade de
dólares ou reais por dia? Trata-se da superação efetiva das necessidades
básicas ou apenas evitar a morte pela fome? A produção agropecuária pode garantir alimentação para 12
bilhões de seres humanos. Como somos pouco mais de 7 bilhões, há evidente
desperdício e impedimento de que muitos tenham acesso aos alimentos. Vivemos em um país que teima em fazer reforma agrária ao
inverso: aumenta a quantidade de terra sob controle de uma minoria e diminui a
destinada aos pequenos proprietários, que são produtores de mais de 70% dos
alimentos da nossa população.
A campanha mundial contra a fome e a pobreza, no Brasil, vai promover
processo de escuta e diálogo com os grupos, comunidades e paróquias, com o
intuito de identificar como os próprios empobrecidos enxergam a questão da
pobreza e da miséria no país. Não vamos retratar a fome, a pobreza e a miséria
apenas como números que colocam o ser humano em uma condição de estatística. Vamos
retratar a verdadeira face dessa realidade e quem nos contará essa história
serão os próprios rostos da pobreza, da fome e da miséria no Brasil. A
expectativa é que, em setembro de 2014, um documento sistematizado com o
resultado de todos esses diálogos seja lançado para a sociedade brasileira.
Alimentados e animados pela frase do nosso grande mestre fundador, dom
Helder Câmara, que nos ilumina dizendo que "o
verdadeiro cristianismo rejeita a ideia de que uns nascem pobres e outros ricos",
vamos alicerçados na esperança e na confiança do Santo Padre, o papa Francisco,
seguindo a nossa missão.
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